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segunda-feira, 12 de março de 2018

PRETENSÃO MAIOR QUE A IDÉIA...

★★★★☆
Título: Os Defensores (The Defenders)
Ano: 2017
Gênero: Ação, Super Herói
Classificação: 16 anos
Direção: Vários
Elenco: Charlie Cox, Krysten Ritter, Mike Colter, Finn Jones, Elodie Yung, Sigorney Weaver
País: Estados Unidos
Duração: 47 min.

SOBRE O QUE É O SERIADO?
Assim que Nova York começa a ser ameaçada por uma organização secreta chamada Tentáculo, quatro heróis acabam tendo seus caminhos cruzados e descobrem que para salvar a cidade precisarão uns dos outros.

O QUE TENHO A DIZER...
Os Defensores foi um projeto ambicioso, pois tinha a intenção de ser o primeiro maior crossover de heróis na televisão, e o segundo maior da Marvel depois de Os Vingadores. Não foi à toa que ele seguiu à risca o mesmo caminho traçado pela Marvel nos cinemas, apresentando os heróis individualmente em suas respectivas séries para, só depois, a mini-série de oito capítulos ser oficialmente lançada.

Demolidor (2015) foi um enorme sucesso, o primeiro herói do selo a ter um conteúdo adulto, e por isso abordou muito bem a violência urbana e a máfia novaiorquina em meio à sua fantasia. A crítica foi extremamente positiva outra vez com Jessica Jones (2015), cheio de metáforas feministas e empoderadoras que carregam a história para um suspense psicológico às vezes até perturbador. Luke Cage (2016) foi igualmente bem recepcionado, resgatando o gênero blaxploitation que engrandece qualquer intenção do personagem em trazer para o primeiro plano a cultura negra e hip-hop.

Mas quando Punho de Ferro (2017) chegou, a parceria da Netflix com a Marvel levou seu primeiro tombo. Depois de três séries aclamadas, a expectativa para o quarto e último personagem era muito alta. Mas a história fraca, personagens mal construídos e uma trama inconsistente fizeram a decepção do público ser maior. Isso teve um impacto direto no lançamento d'Os Defensores porque o público já estava com um senso crítico muito elevado, e depois de Punho, tudo apontava que a reunião dos heróis não poderia ser tão boa quanto se imaginava.

E realmente não foi. A recepção foi morna, a crítica foi mista, e falharam ao entregar aquilo que cultivaram por três anos.

Quando o último episódio chega ao fim, nos perguntamos qual a razão da tentativa de todo esse grande espetáculo, já que o resultado final mostrou que nada daquilo era necessário, pois não evoluiu para qualquer lado a história de cada um dos heróis, e muito menos teve uma grande trama que justificasse a presença ativa de todos.

Seu grande erro foi tentar enfiar muitos conflitos ao mesmo tempo de uma vez só. Tem os heróis com seus conflitos pessoais e individuais, os conflitos que criam entre si, os conflitos de interesse que a trama cria, os conflitos que terão com seus antagonistas, os conflitos entre os antagonistas, e por aí vai. São cenários com muita hostilidade para serem diluídas ou resolvidas, caindo em situações clichés inócuas e aquilo que foi o maior desastre de toda a produção: tentar desenvolver em cima de tudo isso alguma química entre os protagonistas.

Sabe-se que nos quadrinhos Os Defensores foi um grupo com diversas formações, assim como Os Vingadores. Não havia necessidade de fazê-los aqui um grupo conflituoso, em meio a tantas tramas paralelas que naturalmente desenvolveriam isso por eles. Até mesmo a tentativa de fazer Luke Cage e Punho de Ferro serem uma dupla foi um fiasco, já que nos quadrinhos eles são amigos, sendo a relação entre personagens mais aguardada pelos fãs e um banho de água fria para os mesmos.

O que se vê com a mini-série é um festival de papo-furado entre quatro pseudo super-heróis com personalidades difíceis e irredutíveis que se chocam com personalidades individualistas e mau-humoradas o tempo todo, deixando evidente que eles estão desconectados uns dos outros e que em nenhum momento o contrário vai acontecer porque os diálogos sofríveis e a relação que o roteiro cria entre eles não vai deixar isso acontecer em momento algum.

E desconectados eles também estão do universo que estão inseridos. A maioria dos acontecimentos do universo Marvel ocorrem em Nova York, que é onde todos eles estão e onde toda a trama principal se desenvolve, mas a constante negação dos personagens daquilo que são e daquilo que podem fazer não convence que a Nova York que estão é a mesma que foi defendida por Homem de Ferro e seus amigos, já que os eventos de Demolidor, e das séries seguintes, ocorrem um ano após os eventos de Os Vingadores.

Explico.

É muito cansativo eles constantemente duvidarem que neste mesmo universo em que vivem podem existir coisas estranhas e bizarras, ignorando completamente que eles mesmos não são normais. Um exemplo disso é quando Danny explica como se tornou o Imortal Punho de Ferro, e Luke Cage reage com cinismo por achar a história absurda demais. Danny responde simplesmente dizendo que a história é tão absurda quanto Luke ser à prova de balas. Essa resposta sai até como um desengasgo do próprio espectador, porque neste mesmo cenário temos dois cegos que "enxergam" e uma mulher com super força. E no mesmo teor todas as vezes que a policial Misty Knight entra em cena e nunca acredita que coisas muito mais poderosas do que uma simples arma de fogo podem existir, enquanto um homem indestrutível não só está em sua frente como salvou a sua vida diversas vezes.

Ignorância contextual a níveis extremos.

Essas situações são tão incoerentes por si só que não conseguem sequer ser o alívio cômico que pretendiam, transformando-se em momentos extremamente patéticos não só para toda a série, como para os próprios personagens. O pior é que esse é o comportamento que eles terão ao longo de boa parte dos oito episódios.

Não dá para levar a sério um roteiro que remói o mesmo assunto em todo episódio e que sempre coloca um personagem achando aquilo que o outro diz um absurdo, uma mentira, ou um produto imaginário só para criar conflitos fáceis. As constantes idas e vindas das tramas, principalmente nas decisões individuais de trabalharem ou não em equipe, chega a ser de uma repetitividade dolorosa.

Esses conflitos pobres de personalidade unidimensional não ajudam a dar densidade na história em momento algum, aliás essa irredutibilidade de cada um, e que já poderia ser bem mais amena, considerando que cada um deles já apresentou essas personalidades e já trabalhou com seus traumas e problemas pessoais antes em suas séries individuais, é apenas uma estratégia dramática de atrasar a história e retardar eventos porque toda vez que a história tenta avançar, ou uma relação tende a criar algum vínculo afetivo, alguém puxa ela pra trás. Seja Jessica Jones que sempre vai fazer um comentário grosseiro e mau humorado ou Luke Cage que sempre vai repelir alguma proximidade, ao invés do roteiro evoluir esses elementos, acontece o contrário e eles ficam estagnados.

As gafes aqui também são monstruosas por diversas vezes, como no momento em que Sticky usa um incenso para intoxicar Luke Cage. A fumaça é tão seletiva que não atingiu ninguém mais além dele, e só foi atingir apenas Punho de Ferro porque o roteiro assim quis. E demais outros momentos nas cenas de ação que não condizem com os poderes de cada personagem, numa igual seletividade usada apenas para justificar uma ação ou uma reviravolta forçada.

Enfim, em sua boa parte, a mini-série é uma grande decepção. As atuações são ruins, os atores parecem desinspirados e apenas cumprindo uma obrigação contratual. Salvo exceções, não dá pra não enjoar dos cacoetes de Charlie Cox e as caretas que faz para fingir que é cego, da boquinha apertada de Finn Jones pra mostrar que está... sentindo qualquer coisa, ou Elodie Young, que novamente oferece a pior Elektra que a personagem um dia poderia ter.

É inacreditável que os roteiristas tenham feito de heróis tão interessantes um grupo tão fraco e patético, e de uma organização com membros que, em um determinado momento dizem que na última vez que se reuniram ocorreu uma chacina, mal conseguirem se manterem em pé por muito tempo. De todos só sobra a velhinha chinesa que sempre vence apenas com o poder do "rá", enquanto Sigourney Weaver nunca se mostra tão poderosa quanto diz ser, até porque a própria história não consegue explicar ou desenvolver um grande agente motivador que convença o espectador de que o objetivo dos vilões tenha um propósito consistente o suficiente para destruírem uma cidade.

Levando um grande nocaute, Os Defensores não consegue se manter em um ringue onde os heróis se dão melhor sozinhos, em suas próprias séries. O mais revoltante de tudo é que a produção teve uma janela de três anos para projetar tudo até seu lançamento, e a impressão que se tem é de tudo ter sido feito em cima da hora, com os roteiristas escrevendo, literalmente, em cima das coxas.

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